A floresta do litoral
A arborização e fixação das areias do litoral, constituiu uma das obras mais notáveis da engenharia
florestal, protegendo casas e terrenos agrícolas de areias e ventos salgados e
contribuindo de modo essencial para a valorização de importantes áreas litorais,
anteriormente areais desertos e improdutivos.
Estes trabalhos começaram nos tempos de D. Sancho I
e de D. Dinis, conhecendo grande importância quando, em 1805, José Bonifácio de Andrada
e Silva iniciou na costa de Lavos a sementeira dos areais do litoral português. A
Administração Geral das Matas do Reino teve um papel relevante neste domínio entre
1824-1881. O organismo que lhe sucedeu, os Serviços Florestais, acabou por executar
vários trabalhos afins, tendo estes terminado em meados do século.
Assim, entre os séculos XIX e XX, cerca de 37.000 hectares de dunas estéreis foram fixados pela arborização, predominantemente com
pinheiro bravo.
Os difíceis trabalhos de fixação e consolidação
da duna primária do litoral consistiam primeiramente na instalação de ripado paralelo
à linha de costa, até à formação de uma duna com 4 a 5 metros de altura. De seguida
procedia-se à sementeira de variadas sementes, desde a de pinheiro bravo às de plantas
próprias das areias, principalmente estorno, mas também tojo, giesta, camarinheira e
sargaço.
Para fazer alguma cobertura e protecção às jovens
plantas e enriquecer os solos tão pobres, cobriam-se as mesmas com rapão (manta morta em
decomposição), ramas e folhagem diversa.
Citando Arala Pinto no seu livro "O Pinhal do Rei", datado de 1939:
Esses pinheiros, pioneiros do litoral, formando os batalhões,
são a guarda avançada, os sacrificados,
a bem dos seus irmãos já distantes do mar. A sua
missão consiste na segurança das areias e poderão vir a dar lenhas, resinas,
peças para carroçaria mas nunca se deverão abater senão em pequenas parcelas,(...), como os que se praticaram no Pinhal
de Leiria, com bons resultados, (...).
Garantindo o não assoreamento dos campos de cultura, da foz dos rios, das
lagoas, das habitações, dos caminhos e estradas, já o Estado se deve dar por compensado
com a missão que se impôs do revestimento dos areais da costa portuguesa (...)
Os que vierem de futuro, e muitos dos presentes, bendirão o serviço
hoje feito, como nós hoje louvamos os semeadores do "Pínhal
de EI-Rei".
Ainda actualmente, as grandes extensões de
pinhal do litoral são geridas de forma sustentada pelo Estado Português, quer áreas
estatais - Matas Nacionais, quer terrenos pertencentes a autarquias ou a compartes -
Perímetros Florestais. Compete à Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral a
renovação das áreas cortadas, o acompanhamento e condução dos pinhais, a sua
desramação e cortes de mato, os desbastes (regularização de densidades), todas as
operações relacionadas com uma boa gestão, bem como o corte final dos povoamentos.
De referir a procura crescente destes espaços
florestais por visitantes, para lazer e desporto, evidenciando a sua multifuncionalidade.
De Norte para Sul e com características
semelhantes, são as seguintes as Matas Nacionais e os Perímetros Florestais situados no
litoral:
- Perímetro Florestal das Dunas de Ovar
- Mata Nacional da Gafanha
- Mata Nacional de Vagos
- Perímetro Florestal das Dunas de Vagos
- Perímetro Florestal das Dunas e Pinhais de Mira
- Perímetro Florestal das Dunas de Cantanhede
- Mata Nacional das Dunas de Quiaios
- Mata Nacional do Prazo de Santa Marinha
- Mata Nacional da Costa de Lavos
- Mata Nacional da Leirosa
- Mata Nacional do Urso
- Mata Nacional do Pedrogão
- Mata Nacional de Leiria
Desta listagem apenas a Mata Nacional do Prazo de
Santa Marinha, apesar de se situar no litoral, tem características diferentes das outras,
por se tratar duma serra e não de dunas do litoral.
Mata Nacional de Leiria
Do conjunto das Matas Nacionais e Perímetros
Florestais do litoral português sobressai pela sua importância histórica e económica a
Mata Nacional de Leiria, outrora denominada de Pinhal do Rei.
Esta mata situa-se no limite Sul duma grande faixa
litoral de dunas arborizadas com pinheiro bravo que se estende para Norte até Ovar. Tem
11 023 ha, é propriedade do Estado Português e situa-se no concelho da Marinha Grande, a
Sul do rio Lis.
A sua origem remonta provavelmente a tempos
anteriores ao reinado de D. Dinis que, considerando-a como mata da Coroa, estabeleceu as
primeiras regras com vista à sua administração.
Naquela época, ao que tudo indica, a espécie
arbórea predominante nesta mata seria o pinheiro manso, mas foi durante o reinado deste
monarca que nela se fizeram grandes sementeiras de pinheiro bravo. A semente utilizada
para tal, segundo alguns historiadores, terá sido trazida das Landes francesas.
Na Mata Nacional de Leiria é possível referir
três acidentes naturais:
- uma primeira duna, de protecção, situada junto ao
mar, ao longo da costa e fabricada artificialmente no princípio do nosso século;
- um conjunto de dunas orientadas no sentido Norte-Sul,
localizadas na zona central da mata, que atingem a cota máxima de 120m;
- o Ribeiro de Moel, linha de água que atravessa a
Mata no sentido nascente/poente e que desagua no Oceano Atlântico.
A espécie predominante é o pinheiro bravo
existindo também alguns núcleos de pinheiros mansos. A zona envolvente do Ribeiro de
Moel está arborizada com acácias, eucaliptos, choupos, amieiros, carvalhos e salgueiros,
grande parte dos quais instalados artificialmente.
Actualmente, a Mata Nacional de Leiria, para além
da sua importante função ambientam, assume-se como uma mata de produção de madeira de
grande qualidade.
As árvores produtoras desta madeira são cortadas
com cerca de 80 anos. Ao longo deste período, através de desbastes, é feita uma
selecção sendo cortados e retirados do povoamento os exemplares de piores
características. Os melhores pinheiros permanecem até ao corte final, pois produzem a
maior quantidade de madeira de qualidade, sendo também desses que provêm as sementes que
darão origem aos novos povoamentos, que assim vão tendo as suas características
melhoradas ao longo das gerações.
Postes, rolaria e outro material lenhoso de pequenas
dimensões são os produtos que a mata fornece em desbastes. A resina constitui um produto
secundário sendo explorado apenas nos três últimos anos antes das árvores serem
abatidas, de modo a não deteriorar a qualidade da madeira.
Há mais de um século que a exploração desta mata
está sujeita a planos de ordenamento. Todos os cortes estão programados de modo a que a
mata se renove sem que seja alterada a sua capacidade produtiva. Todas as áreas cortadas
são de novo arborizadas, sendo a mata gerida de forma sustentada e multifuncional.
A Mata tem também um papel muito importante na
protecção das dunas do litoral e no abrigo contra os ventos marítimos e o sal por eles
transportado. Todo o coberto vegetal existente na faixa mais próxima do mar tem o efeito
duma barreira protectora, imprescindível para que possa haver um bom desenvolvimento dos
pinhais e culturas situados para o interior.
Para além da sua importância económica,
confirmada pelo volume das receitas anuais geradas, proveniente fundamentalmente da venda
de árvores, a Mata Nacional de Leiria tem também uma função social para as
populações que habitam na sua periferia, pelos produtos que dela extraem (lenhas,
pinhas, mato, carumas) e pelos postos de trabalho que faculta. A caça tem sido outro
recurso proporcionado pela existência da Mata, onde tem sido possível caçar as
espécies cinegéticas que ocorrem com mais frequência na zona, destacando-se a rola,
pombo, tordo, coelho, raposa e perdiz.
Durante todo o ano mas em especial na
Primavera-Verão, a Mata é também um espaço de lazer e de ocupação de tempos livres,
com zonas próprias para piqueniques e passeios a pé e de bicicleta. O Ribeiro de Moel, o
Tromelgo e a Formosa são os locais mais procurados para estas actividades.
Na Mata existem ainda três parques de campismo que
no verão acolhem muitos dos turistas que visitam a região.
Carta da mata desenhado por Luis Filipe em 1940
Carta da mata em 2000 com as zonas de produção elaborada por Suzana Gomes